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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Clínica causa polêmica com tratamento de mudança de sexo em crianças

Portal Terra
17 de Novembro de 2013

Uma clínica pública da Inglaterra tem causado polêmica ao tratar crianças transexuais com menos de 12 anos, dando a elas bloqueadores hormonais que preparam mais cedo para a mudança de sexo. Segundo o site do jornal inglês Daily Mail, o procedimento é feito por outros médicos apenas após os 16 anos.

O tratamento, feito para frear os efeitos da puberdade e prevenir que as crianças desenvolvam as características sexuais do gênero que nasceram, foi realizado em mais de 20 jovens que sofrem com transtorno de identidade de gênero. O uso de medicação foi iniciado em 2011, na Tavistock Clinic, em Londres, como parte de um estudo em que os especialistas queriam avaliar os benefícios dos médicos caso começassem a ser introduzidos mais cedo na vida das crianças, de acordo com o jornal Sunday Times.

Na época, a iniciativa foi considerada controversa, já que muitos pacientes não tinham condições de entender e consentir com a terapia. No entanto, o local recebeu pedidos de 142 crianças entre 11 e 15 anos enviados por pais e profissionais de educação.

A diretora da clínica, Dra. Polly Carmichael, afirmou que continuará o tratamento com as crianças mesmo depois que o resultado do estudo seja divulgado, em abril de 2014. "Trinta e cinco crianças já foram aceitas no estudo e 23 delas receberam bloqueadores hormonais. Outras 12 também participam, mas não receberam o tratamento porque ainda estão muito no início da puberdade", afirmou. Segundo ela, quando completam 16 nos, as crianças têm duas opções: parar de receber bloqueadores hormonais ficando com o mesmo sexo do nascimento ou fazer uso de outros hormônios que levam a mudança de corpo e, aos 18 anos, a clínica pode encaminhar para cirurgia de mudança de sexo.

A abordagem da clínica se diferencia de outros procedimentos feitos no Reino Unido, onde as crianças não recebem nenhum tipo de hormônio até os 16 anos e, somente depois dessa idade, fazem tratamentos específicos e eficazes para a mudança de sexo. Mas, os defensores do tratamento argumentam que muitas delas já viveram o início da puberdade bem antes dos 16 anos o que dificulta a transição no futuro, uma vez que o corpo já recebeu cargas de hormônios do sexo de nascimento . "É melhor para as crianças que não tenham passado pela puberdade antes do tratamento de transição", explica a Dra. Carmichael.

Apesar do procedimento, a especialista reconhece que é um passo grande demais a ser tomado por crianças com esta idade e que isto exige certos cuidados. "Você está exigindo de uma criança de 11 anos para que decida sobre sua vida adulta e sua identidade, por isso temos que ter muito cuidado para manter as opções em aberto", afirma.

Recentemente, o adolescente de 12 anos Leo Waddell foi a público pedir que os médicos permitesse que ele use os bloqueadores de hôrmonio. Nascido como uma menina chamada Lili, ele vive como um garoto desde os cinco anos e pretende fazer uso de testosterona quando chegar aos 16 e, aos 18, passar pela cirurgia de mudança de sexo. Mas, até lá, ele acredita que é melhor usar os medicamentos para bloquear a puberdade e evitar que os hôrmonios femininos se espalhem pelo seu corpo.

No entanto, os especialistas recusaram o pedido de Leo ao alegar que não têm certeza sob os efeitos a longo prazo que o uso destes remédios podem causar. "O que as pessoas não entendem é que é muito mais perigoso para ele não receber os hormônios, porque este tormento está fazendo ele ficar cada mais triste", afirmou a mãe de Leo, Hayley.

Em 2009, aos 16 anos, Jackie Green foi a pessoa mais jovem do mundo a realizar a cirurgia de mudança de gênero. Ela havia nascido menino e recebia hormônios desde os 12 anos, em Boston, nos Estados Unidos. Três anos após o procedimento, ela tornou-se a primeira transexual a estar entre as finalistas do concurso Miss Inglaterra.


Disponível em http://saude.terra.com.br/doencas-e-tratamentos/clinica-causa-polemica-com-tratamento-de-mudanca-de-sexo-em-criancas,7ce2aefd16762410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html. Acesso em 23 nov 2013

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Equívocos de autoimagem, transtornos e qualidade de vida

Cassiana Perez, Janaina Quitério, Juliana Passos
10/11/2013

O excesso de preocupação com a própria imagem tornou-se um fator moral de grande relevância. Quem afirma é o psicanalista e professor livre-docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) Christian Dunker, que, pegando emprestadas as palavras do historiador norte-americano Christopher Lash, afirma que nos tornamos uma cultura do narcisismo, em suas várias vertentes, ao vivenciar a espetacularização generalizada (Guy Debord), a tirania da intimidade (Richard Sennet), a liquidez das relações (Zygmunt Bauman) e a localização da verdade na sexualidade (Michel Foucault): “Estar insatisfeito com a própria imagem é, em muitos sentidos, querer ‘ser outro’, e isso é uma das formas mais contemporâneas de querer, ou seja, de desejar”, explica.

A imagem pessoal, como um construto multidimensional formado por aspectos fisiológicos, cognitivos e sociais, além de desejos e atitudes emocionais em relação a si mesmo e aos outros, está sujeita a uma série de interferências que, em situações extremas, pode acarretar em transtornos complexos e de difícil tratamento. Em alguns casos, as distorções de autoimagem podem até trazer benefícios em curto prazo, mas comumente são danosas aos indivíduos e causam problemas de relacionamento e angústia extrema ao longo do tempo.

As ilusões positivas estão fortemente presentes em pessoas cuja percepção é supervalorizada em relação às suas habilidades e capacidades. Ao cumprir tarefas rotineiras, creem se sair melhor do que atestariam medidas objetivas de eficiência, com bem-estar pessoal momentâneo. Segundo evidenciou um estudo de Richard Robins e Jennifer Beer, ambos da Universidade da Califórnia, as ilusões positivas não raro aparecem relacionadas ao Transtorno de Personalidade Narcisista (TPN), cuja principal característica é a necessidade de admiração e de aprovação constante do indivíduo pelos que o cercam. Em sua forma patológica, os narcisistas se voltam para si mesmos a fim de compensar o complexo de inferioridade, comportando-se de maneira arrogante.

Contudo, é normal que as ilusões positivas desfaçam-se uma vez que o indivíduo não seja capaz de alcançar metas às quais julgava ser merecedor. A mudança da autopercepção, a partir desse ponto, pode ocasionar desmotivação na sequência de um projeto, por exemplo, e expor a baixa autoestima latente no TPN, causando profunda frustração. Dessa forma, em longo prazo, essas pessoas evitam situações em que são testadas e podem tornarem-se socialmente defensivas e inseguras em relação a si mesmas.

Embora os narcisistas patológicos sejam capazes de perceber o que é importante para as pessoas ao seu redor, isso não lhes causa empatia, pois estão completamente voltados para si e para a proteção de seu próprio ego. Segundo o filósofo Luiz Felipe Pondé, o narcisista não é autossuficiente, porém a única forma de relação que estabelece é aquela na qual os outros estão lá para servi-lo.

As causas dessa distorção de autoimagem, que afeta diretamente o convívio social, parecem ser, de acordo com estudo publicado na revista Journal of Psychiatric Researchem junho deste ano, uma anomalia estrutural no córtex cerebral, com redução da matéria cinzenta (importante componente do sistema nervoso central), exatamente na área do cérebro responsável por processar e gerar sentimentos de compaixão. O grupo de estudos liderado por Stephan Röpke, da Universidade de Medicina de Berlim, busca agora entender como o cérebro dos narcísicos trabalha, a fim de desenvolver um tratamento efetivo para esse transtorno.

É importante ressaltar que, para o psicanalista da USP Christian Dunker, o narcisismo se configura tanto como o momento de constituição do eu, entre 18 e 36 meses de idade, quanto a um funcionamento intersubjetivo mais permanente. “Como estrutura, podemos inferir algumas dificuldades de alguém para quem o narcisismo não se instalou a contento. Seria alguém que não consegue se reconhecer muito bem nas emoções, nas palavras e nos desejos de outros.” Portanto, para ele, até certo ponto, o narcisismo é uma estrutura fundamental e benéfica para sustentar o funcionamento social do indivíduo.

Diferentemente do Transtorno de Personalidade Narcisista e das ilusões positivas associadas, o Transtorno de Identidade de Gênero (TIG), ou transexualidade, pode ser de difícil tratamento e causa de sofrimento e angústia ao longo da vida. O TIG é caracterizado pela não identificação com o gênero biológico, com consequente sentimento de inadequação ao papel social que se espera. Para os transexuais, o corpo não corresponde à forma como pensam, e a adequação pode ser realizada de diversas maneiras, desde tratamentos psicológicos ou hormonais à cirurgia de redesignação de gênero.

O TIG não tem relação com a orientação sexual, porém o estigma da perversão cerca os transexuais e dificulta ainda mais o convívio social e bem-estar psicológico. Em entrevista à jornalista Marília Gabriela, a modelo transexual brasileira Lea T. afirmou crer que nunca será realmente uma mulher, ainda que se sinta assim. Para ela, os transexuais são vistos como “o lixo da sociedade” e não têm lugar garantido mesmo após a realização da cirurgia de redesignação de gênero. O desconforto de estar preso a um corpo biologicamente inadequado é comparado pela modelo àquele causado ao calçar os sapatos nos pés trocados, com a diferença de que os transexuais permanecem nessa situação por toda a vida.

A definição do TIG como um distúrbio de autopercepção, no entanto, não é consensual entre os profissionais da área de saúde mental e, em 2012, a transexualidade deixou de ser considerada patologia pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic e Statistic Manual of Mental Disorders), da American Psychiatric Association, e passou a ser visto como questão de identidade. Seguindo essa linha de interpretação, muitos psicólogos defendem que a autorrealização do transexual deva ser a aceitação plena de quem ele é, de corpo e mente, e somente após a consolidação da identidade seria possível optar ou não pela realização da cirurgia de transgenitalização. No Brasil, no entanto, o TIG é considerado patologia, o que garante aos pacientes acesso a tratamentos hormonais, psicoterápicos e à cirurgia.

Em busca do corpo perfeito

“A imensa valorização que a aparência recebe em nossa sociedade, e por expressar valores construídos socialmente e compartilhados, é capaz de afetar globalmente a maneira como aprendemos a lidar com nosso corpo. A cultura dá os subsídios constituintes de nossa subjetividade e direciona os processos de socialização e simbolização do corpo”, analisa a socióloga e professora da Universidade Federal do Paraná Rubia Giordani.

A necessidade de mudanças no próprio corpo com a finalidade de alterar a imagem corporal está presente, por exemplo, na Dismorfofobia, ou Transtorno Dismórfico Corporal (TDC). Esse distúrbio psicológico é caracterizado pela preocupação obsessiva com um defeito físico inexistente ou mínimo que o paciente percebe a despeito de sua aparência. O período da primeira manifestação do TDC é, em geral, o início da adolescência, época de mais atenção à aparência física devido às mudanças corporais e psicológicas típicas da fase.

Analisando o TDC sob a perspectiva comportamental, as psicólogas Josy Moriyama e Vera Lúcia do Amaral, da PUC-Campinas, constataram que o comportamento de fuga ou esquiva dos pacientes em relação aos eventos, ocasiões e contextos em que suas preocupações e sentimentos aversivos sobre a aparência poderiam ocorrer é um traço comum. E, ao se esquivarem de situações potencialmente desagradáveis, reforçam o comportamento, prejudicando sua vida social de forma que resulte em isolamento e depressão. As autoras notaram ainda traços comuns nas histórias de vida dos pacientes, com grande incidência de práticas educativas coercitivas, baixa habilidade social, grande valorização da aparência por pessoas com as quais conviveram durante a infância e eventos desagradáveis relacionados à parte do corpo com que se preocupavam.

Os indivíduos com TDC dificilmente procuram auxílio psicológico, sendo mais comum a busca por consultórios de medicina estética, uma vez que acreditam que seus problemas advêm diretamente do defeito físico. A realização de procedimentos estéticos, no entanto, ao contrário de aliviar os sintomas do TDC e melhorar a qualidade de vida, causa mais transtornos, já que, em geral, promete resultados tão irreais quanto o defeito imaginado. Manchas na pele, formato do nariz, tamanho do bumbum e cicatrizes estão entre os motivos que levam a desenvolver o transtorno. As pesquisadoras também mostraram que a TDC não está ligada ao critério de renda e de escolaridade.

A anorexia é a terceira doença crônica psiquiátrica mais comum em meninas adolescentes e com um índice de mortalidade de 5,6%, de acordo com dados da Associação de Psiquiatria Americana (APA). A distorção da imagem corporal e a compulsão pela magreza são associadas a inúmeras explicações, desde a influência dos meios de comunicação, baixa autoestima, ansiedade e também a fatores genéticos, embora desencadeados por fatores externos.

Tratar o distúrbio alimentar como modo de vida foi observado pela doutora em psicologia Andreia Giacomozzi em artigo publicado na revista Psicologia, Saúde e Doenças, em 2012, ao analisar o comportamento das jovens em comunidades do Orkut. “Pelo que observei, as participantes das comunidades não reconhecem anorexia e bulimia como doenças, mas como estilo de vida para atingir a perfeição, que, para elas, significa ter sucesso pessoal e felicidade. O problema é que, em alguns casos, elas não conseguem parar de fazer as dietas e se tornam 'escravas' desse estilo de vida”.

Bárbara tem 18 anos e diz que não se lembra de quando começou a "miar" (provocar vômitos). "Acho que com sete ou oito anos de idade". Para a capixaba, a busca pela magreza ou "perfeição" não é uma doença, e sim uma opção de vida. Ela chegou a ser internada no começo do ano, quando contou à mãe sobre a situação. A adolescente já fez terapia por dois meses, mas diz que prefere usar apenas seu blog para desabafar com outras garotas que também consideram Ana e Mia (como chamam anorexia e bulimia) como um modo de viver. 

No diário virtual, ela relata períodos com quantidades mínimas de comida ou jejum absoluto – identificados pelos termos no food (NF) e low food (LF). Bárbara faz ginástica rítmica todos os dias e já desmaiou duas vezes durante um treino. Na segunda, foi hospitalizada. Em seu blog, uma imagem com a tabela de "peso ideal" indica que, para sua estatura de 1,65 metro, ela deveria pesar 40 quilos. Nesse cálculo, o Índice de Massa Corpórea (IMC) fica em 14, enquanto o mínimo ideal é 18,5.

“Nesse imaginário patológico, o desafio é resistir à fome e seguir emagrecendo. É insustentável biológica e emocionalmente, e a “queda” é inevitável. Dificilmente se contentam, e há uma tendência de as metas de perda de peso se tornarem cada vez mais difíceis. Quando esses processos severos se perpetuam, levam inexoravelmente à desnutrição e às alterações bioquímicas sérias no organismo”, comenta a pesquisadora Rubia Giordani. O peso insuficiente (85% do nível normal ou inferior) provoca interrupção do ciclo menstrual, pode levar à infertilidade, queda de cabelo e da temperatura do corpo – a pessoa sente muito frio –, anemia e arritmias cardíacas.

A profissional de educação física Renata, de 27 anos, refuta a ideia de opção de vida: “Não falo Ana/Mia porque são doenças, e não amiguinhas para as quais dou apelidinhos. Acho ridículo nomear doenças tão sérias com nomes carinhosos”, diz. Mesmo reconhecendo como doença, ela luta diariamente para fazer todas as refeições e não consegue acreditar, como seus pais e amigos dizem, que está magra. “Vejo gorduras e tudo sobrando, coisas que adoraria mudar”. Após três anos de tratamento, Renata recebeu alta, mas continua em acompanhamento por seu caso ser crônico. Ela também mudou a área de atuação profissional por conta do transtorno alimentar. Ter um corpo perfeito não é a única cobrança que ela faz de si mesma: “Eu gostaria de ser perfeita, em tudo. Sempre acho que poderia fazer melhor, então sou extremamente rigorosa comigo em todos os aspectos”, conta.

É importante ressaltar que o público masculino também tem preocupações relativas à corporeidade, o que influencia na forma como se alimentam, na prática de exercícios físicos e mesmo na adesão de dietas radicais, como observou a psicóloga e mestre em ciências pela USP de Ribeirão Preto Thais Fonseca de Andrade, cuja dissertação foi baseada em homens com transtornos alimentares. Ela faz uma alerta: “É fundamental o papel dos profissionais de saúde, de professores e, ainda, da mídia no sentido de orientar a sociedade e encorajar adolescentes, jovens e adultos do sexo masculino a conversarem sobre suas preocupações acerca da imagem corporal e do peso. É importante sempre assegurar que tais questões são comuns em ambos os sexos, já que os homens tendem a não falar abertamente, como as mulheres, sobre conflitos corporais e emocionais”, aponta.

Para ela, o tratamento deve ser realizado por uma equipe interdisciplinar, uma vez que o transtorno alimentar é uma doença que abrange o corpo e a mente. “A psicoterapia psicanalítica, por meio do vínculo entre terapeuta e paciente, é um espaço de confiança e criatividade, no qual as emoções primitivas e muitas vezes obscuras do paciente podem ser sentidas, expressas e pensadas”, conclui.


Disponível em http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=93&id=1151. Acesso em 13 nov 2013.

domingo, 3 de novembro de 2013

O que alimenta o preconceito contra transexuais?

Natasha Romanzoti
em 9.10.2011

O tema “transexual” é com certeza um dos assuntos mais polêmicos na sociedade, que provoca fortes reações emocionais. Muitas vezes, essas reações têm tons predominantemente negativos, o que levanta a questão sobre a raiz da hostilidade quanto a esse tópico.

Segundo uma acadêmica que estuda atitudes e comportamentos sociais, o desconforto em relação às pessoas transexuais vem de convenções desafiadoras.

Diane Everett, professora de sociologia, diz que na cultura americana, sexo e gênero pertencem a uma de duas categorias. Assim que os seres humanos nascem, a primeira coisa que as pessoas perguntam é se o bebê é um menino ou menina.

“Temos a tendência, como sociedade, de colocar as pessoas em caixas”, disse ela. “Um transexual não só atravessa as fronteiras de gênero, mas também as desafia. Se as pessoas não veem você como ‘ou isso ou aquilo’, elas têm dificuldade em se relacionar com você em seu nível de conforto”, explica.

Depois, há pessoas que por razões religiosas acreditam que os transexuais são fundamentalmente “errados”, que Deus criou o homem e a mulher e, automaticamente, o homem é macho, a mulher é fêmea, e eles não devem cruzar essas linhas.

As questões geralmente acabam em um debate sobre qual banheiro as pessoas transexuais deveriam usar. Isso é um símbolo de toda a controvérsia, porque tem a ver com gênero, sexualidade e nível de conforto.

O desconforto decorre da visão de que uma pessoa é do sexo feminino ou masculino. Mudar o sexo com que você nasce é “basicamente automutilação”, disse Regina Griggs, diretora do grupo Parentes e Amigos de Ex-Gays & Gays. “É uma cirurgia que altera quem você realmente é do ponto de vista biológico”.

Segundo Regina, pessoas com transtorno de identidade de gênero merecem ajuda médica e psiquiátrica adequada. Transtorno de identidade de gênero é listado como doença no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, a “bíblia” da psiquiatria.

Pessoas transexuais desafiam as ideias arraigadas na sociedade sobre gênero e sexo. As pessoas são ensinadas que meninos são meninos, meninas são meninas e meninos casam com meninas.

“Todas essas coisas são verdadeiras para a maioria das pessoas”, disse Mara Kiesling, diretora do Centro Nacional para a Igualdade Transexual. “É verdade que a maioria das pessoas é do sexo masculino ou feminino e isso é imutável para a maioria das pessoas. O que estamos aprendendo agora é que nenhuma dessas coisas é totalmente imutável”, explica.

Pessoas transexuais enfrentam um estresse de minoria, o que significa que elas se sentem indesejadas como uma minoria excluída. Elas também enfrentam o estigma, às vezes de suas próprias famílias, além de discriminação no trabalho e bullying.

A hostilidade pode vir, por vezes, de forma surpreendente. Uma mulher transexual, Amber Yust, que mudou seu nome de David, foi ao Departamento de Veículos Motorizados em San Francisco, EUA, para atualizar sua licença. Ela recebeu uma carta de um dos funcionários, acusando Yust de agir de uma maneira que é “uma abominação que leva para o inferno”. O empregado foi identificado e, posteriormente, se demitiu.

Ainda assim, nos dias de hoje, muitas manifestações contra transexuais são tornadas públicas e adquirem tamanha repercussão que oprimem ainda mais essas pessoas. O fim dessa discussão, no entanto, está muito longe – a mudança de pensamento vai demorar a chegar, tendo em vista o tamanho dos conceitos que precisam ser revisados para tanto.


Disponível em http://hypescience.com/o-que-alimenta-o-preconceito-contra-transexuais/. Acesso em03 nov 2013.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Orgasmo ajuda a prevenir doenças físicas e mentais, diz estudo

BBC BRASIL
10 de agosto, 2012

Magdalena Salamanca, psicanalista especializada em sexo baseada na Espanha, disse à BBC que a ausência do prazer sexual pode provocar doenças e transtornos mentais.

"É importante porque o orgasmo é a satisfação de um dos instintos mais importantes do ser humano, que é o sexual", diz.

Ela destacou ainda que muitos dos problemas de cunho social ou profissional estão vinculados à insatisfação sexual. "Por exemplo, a ansiedade é um dos transtornos mais relacionados com a ausência do orgasmo".

Além disso, a psicóloga Ana Luna disse que "fisiologicamente, a descarga de muitas tensões que o ser humano acumula se produz por meio do orgasmo".

Atividade cerebral

Há alguns meses, cientistas da Universidade de Rutgers, no Estado americano de Nova Jersey, determinaram que o orgasmo ativa mais de 80 diferentes regiões do cérebro.

Utilizando imagens de ressonância magnética do cérebro de uma mulher de 54 anos enquanto tinha um orgasmo, os cientistas descobriram que no ato quase todo o cérebro se torna amarelo, o que indica que o órgão está praticamente todo ativo.

Os níveis de oxigênio no cérebro também refletem um espectro que vai desde o vermelho intenso até um amarelo claro, e isto tem um impacto em todo organismo.

Benefícios para a saúde

"Há outros benefícios porque todo esse sangue oxigenado que flui pelo corpo chega aos microssensores da pele e vai para todos os órgãos", diz a psicóloga Ana Luna.

Já Magdalena Salamanca destaca que a saúde física e psíquica estão muito vinculadas à satisfação sexual proporcionada pelo orgasmo, o que o estudo da Universidade Rutgers parece comprovar.

A pesquisa mostrou como a atividade cerebral iniciada pelo orgasmo se propaga por todo o sistema límbico, relacionado às emoções e à personalidade.

Por isso, psicólogos como Ana Luna acreditam que o orgasmo é uma parte essencial de uma personalidade sadia.

"Quando você não tem orgasmo toda essa energia fica represada", diz a estudiosa, acrescentando que muitas vezes a ausência do prazer sexual torna a pessoa irritadiça, triste, rabugenta e até mesmo com dificuldades para sorrir.


Disponível em http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/08/120810_orgasmo_saude_jp.shtml. Acesso em 25 ago 2013.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Transtorno de identidade sexual na infância divide especialistas

Carolina de Andrade 
20/11/2012 

Aos oito, ele mandou um e-mail para as pessoas da escola onde estudava (e sofria bullying) avisando ser "uma menina presa em um corpo de menino". E passou a se vestir como garota. Aos dez, disse à mãe que se mataria se começasse a "virar homem".  

Aos 11, Jack teve uma overdose e fez outras seis tentativas de suicídio antes de completar 16 anos. 

Como a lei inglesa não permite cirurgia de mudança de sexo antes dos 18, Jack foi operado na Tailândia, aos 16. 

A história de Jack, que a rede de TV britânica BBC exibe hoje, mostra os contornos e as dores do transtorno de identidade sexual na infância. Jackie Green tem agora 19 anos, é modelo e foi a primeira finalista transexual do concurso de Miss Inglaterra. 

A OMS define o fenômeno como o desejo, manifesto antes da puberdade, de ser (ou de insistir que é) do outro sexo. O termo "transexualismo" só é usado para adultos. 

Não há estatísticas de incidência do fenômeno. Entre pessoas acima de 15 anos, estima-se que um a cada 625 mil seja transexual, segundo o psiquiatra Alexandre Saadeh (leia entrevista abaixo). 

De acordo com Carmita Abdo, do programa de estudos em sexualidade da USP, a experiência clínica mostra que só um terço das crianças com o transtorno serão transexuais. 

Na visão da psiquiatria, transexualidade não é escolha, como querem alguns setores. Como psiquiatra, é claro que Alexandre Saadeh defende o diagnóstico de transtorno de identidade sexual na infância --embora critique seu uso estigmatizante. Professor da PUC-SP e coordenador do Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual do Hospital das Clínicas de São Paulo, ele conta como a medicina caracteriza o problema, à luz das últimas pesquisas. 

Folha - Como saber se a criança sofre de transtorno de identidade de gênero? 

Alexandre Saadeh - Pode ser que a criança esteja só brincando de assumir um papel, o que é comum entre os quatro e os seis anos, faz parte do desenvolvimento. Para constatar o transtorno é preciso que o comportamento ocorra por tempo prolongado. 

Quais são os indícios? 

Não é só o uso de roupas ou a criança se chamar por nome do outro gênero. Ela apresenta outros sinais: fica deprimida, irritada e agressiva se é obrigada a se comportar segundo o sexo anatômico. A necessidade de ser tratada como se fosse do outro gênero é constante. Muitas percebem que o comportamento incomoda os pais, aí o escondem. Os primeiros indícios surgem na infância, mas são raros os casos em que é claro desde o início se tratar de transexualismo. Nem toda criança com o transtorno fará cirurgia de mudança de sexo quando adulta. Mas todo transexual teve o transtorno. A criança deve ser avaliada por profissionais para evitar diagnósticos equivocados. 

Quais são as causas? 

Há evidências de que a diferenciação cerebral intrauterina pode ser influenciada por níveis de andrógenos [hormônios que desenvolvem as características sexuais masculinas] circulantes na gestação, o que pode gerar um cérebro masculino ou feminino, independentemente da anatomia já definida. Apesar da importância do ambiente e da cultura, não há evidências de como esses fatores se acrescentam aos fenômenos biológicos. 

Quais são as alternativas após o diagnóstico da criança? 

Pais e profissionais devem ajudar a criança a vivenciar o transtorno e, se for o caso, superá-lo; se não, a vivenciá-lo de maneira integral, sem censura. Não é fácil para nenhum pai ou mãe se adaptar a essa transformação, mas quando se pensa em respeito e aceitação pela diferença e por quem é de verdade o filho ou filha, fica mais palatável. No Brasil, a cirurgia só pode ser feita após os 21 anos, mas o uso dos hormônios pode começar a partir dos 18. Se tivermos certeza de que o adolescente já é um transexual, é possível tentar autorização junto ao Conselho Federal de Medicina para começar o tratamento hormonal antes. 

Os efeitos do tratamento hormonal para impedir a puberdade são reversíveis? 

Há a possibilidade de se bloquear o desenvolvimento das características masculinas ou femininas do adolescente, ou já fazer o tratamento hormonal específico para o gênero desejado. Alguns efeitos são reversíveis, outros não, por isso a controvérsia e a responsabilidade da indicação desse tipo de intervenção, o que aumenta mais a importância do diagnóstico. Sou a favor do bloqueio e do tratamento hormonal, já que impedem que a pessoa passe pelo sofrimento de desenvolver caracteres sexuais de seu sexo anatômico e não de sua identidade de gênero. 

A visão do transexualismo como transtorno é unânime? 

Para os [profissionais] que se preocupam em se atualizar nas pesquisas, é, sim. O problema é confundir transexualismo e homossexualidade ou tratar como doença mental. É um transtorno do desenvolvimento cerebral. As explicações psicológicas clássicas não conseguem mais caracterizar o fenômeno. As ciências humanas tendem a ser contra o diagnóstico e o consideram estigmatizante, do que discordo. Pode haver esse uso do diagnóstico, mas não é essa a finalidade. 

Qual sua opinião sobre os movimentos pela "despatologização" do transexualismo? 

Acredito no diagnóstico como delineador, não como estigmatizante. Como psiquiatra, não posso achar que o transexualismo seja questão de escolha. É questão de desenvolvimento embrionário, relacionada ao desenvolvimento cerebral na fase de diferenciação entre cérebro masculino e feminino. 

Como vê o "gender-neutral parenting", essas tentativas de criar uma educação sem estereótipos sexuais, a exemplo de uma escola na Suécia que não usa "ele" ou "ela" para se referir às crianças? 

A sociedade funciona com diferenciação de gêneros. A criança terá contato com os gêneros cedo ou tarde e isso pode gerar confusão.

Disponível em http://noticias.bol.uol.com.br/ciencia/2012/11/20/transtorno-de-identidade-sexual-na-infancia-divide-especialistas.jhtm. Acesso em 29 nov 2012.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Pai narra luta para fazer o filho aceitar a própria homossexualidade

David Sheff
15 de Novembro de 2012
 
John Schwartz enxerga o sofrimento do filho depois de uma tentativa de suicídio e lança livro sobre o difícil caminho que o garoto percorreu para se aceitar 

Jeanne Mixon, esposa do jornalista do New York Times John Schwartz, entrou em casa uma tarde para encontrar o filho de 13 anos, Joe, incoerente, de “olhos esbugalhados” e nu no banheiro. Frascos de comprimidos estavam espalhados pelo chão e havia uma faca dentro da banheira. Joe tentou se matar.

A cena – um pesadelo para todos os pais - abre o livro de memórias de John Schwartz, “Oddly Normal: One Family’s Struggle to Help Their Teenage Son Come to Terms With His Sexuality”(ainda sem título em português, mas que pode ser traduzido como ‘Estranhamente normal: a luta de uma família para ajudar seu filho adolescente a aceitar sua sexualidade’).

A publicação é um relato emocionante do aprendizado de Joe para conseguir aceitar sua sexualidade, assim como o esforço de seus pais para protegê-lo da homofobia e ajudá-lo a suportar um sistema escolar que continua a marginalizar crianças que precisam de compreensão.

Schwartz está no trabalho quando Jeanne liga para lhe dizer que o filho tentou se matar. Ele corre para o hospital, onde se senta ao lado da cama de Joe, implorando ao filho que beba uma solução que neutralizará o efeito das drogas ingeridas. É possível sentir sua angústia quando ele tenta persuadir o filho: “vamos, Joseph. Mais um gole. Vamos. Um golinho mais apenas."

Anos antes, o casal já tinha reparado na paixão de Joe por seus “lindos” brinquedos, como ele mesmo definia, e suas bonecas. John e Jeanne sabiam que seu filho era gay. Ao contrário de muitos pais, eles estavam ansiosos para ver o menino sair do armário e se assumir. 

Drogas poderosas 

Mas mesmo pais compreensivos como os da família Schwartz não poderiam proteger seu filho da implacável experiência escolar, nem de si mesmo. O livro conta um episódio quando Joe, sentindo-se mais corajoso depois de assumir sua homossexualidade, repreendeu um grupo de meninos sobre a forma que eles classificavam as meninas. Ele passou a classificar os meninos também: "você é nota sete. Você é nota cinco.” À medida que os meninos iam ficando desconfortáveis, Joe zombava de todos e os desafiava: “os garotos estão com medinho do menino gay?", perguntava.

As crianças contaram o que aconteceu para um conselheiro da escola e a história se espalhou deixando Joe deprimido. Horas mais tarde, ele engoliu mais de duas dezenas de cápsulas de Benadryl (anti-histamínico vendido em farmácia). “Se tivéssemos mantido drogas mais poderosas em casa, poderíamos ter perdido nosso filho”, escreve Schwartz.

Adolescentes LGBT

Schwartz relata que as estatísticas sobre adolescentes gays que cometem suicídio, ou pelo menos tentaram, “são obscuras”, mas sua análise o leva a concluir que uma investigação melhor sobre o assunto acabará mostrando uma taxa substancialmente mais elevada de suicídio e uma maior incidência de pensamentos suicidas entre os adolescentes LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e travestis) do que na população em geral.

Muitos adolescentes gays tiraram as próprias vidas, incluindo Tyler Clementi, o estudante americano que pulou da ponte George Washington depois de saber que um colega de quarto colocou na internet imagens dele beijando outro homem e enviou mensagens no Twitter incentivando outros estudantes a assistirem a cena.

Schwartz ainda ressalta que a intimidação ostensiva não é o único tipo de bullying que afeta crianças gays. De acordo com uma pesquisa, cerca de 90% dos estudantes gays disseram ter ouvido a palavra “gay” sendo usada de forma pejorativa e 72% relataram ter ouvido palavras homofóbicas como “bicha”. O resultado, Schwartz escreve, “são filhos gays que podem carregar um valentão internamente que os faz se sentir miserável, não importando se tem ou não alguém mexendo com eles pessoalmente.”

Transtornos psiquiátricos

A tentativa de suicídio de Joe parecia uma reação ao ostracismo na escola, mas Schwartz tem o cuidado de não aceitar explicações muito simples diante da profundidade do desespero de seu filho. Joe foi ridicularizado durante boa parte de sua infância porque ele era diferente, e não só por ser desajeitado em esportes e efeminado. Ele também era dado a explosões de raiva dirigidas a outras crianças e professores. Além disso, há indícios de que ele poderia ter tido um ou mais transtornos psiquiátricos.

Schwartz também olha para si mesmo e descreve suas próprias falhas como pai. Ele narra dolorosamente os erros que ele e a mulher cometeram, incluindo as tentativas anteriores de suicídio de Joe que nunca foram percebidas pelos pais. Scwartz conta que uma vez chegou a aceitar as desculpas do filho quando encontrou sinais de que Joe poderia ter tentado estrangular a si mesmo. Schwartz escreve: “a esta altura você pode estar pensando que éramos cegos. Em retrospecto, a única resposta que eu posso dar é ‘sim, é basicamente isso’”.

É claro que a leveza que permeia a história deste pai, que tentou desesperadamente ajudar o filho homossexual, só é possível porque a tentativa de suicídio de Joe não se concretizou - ao contrário de muitos outros, incluindo o caso de Tyler Clementi.

Disponível em http://www.cenariomt.com.br/noticia.asp?cod=249126&codDep=8. Acesso em 27 nov 2012.

domingo, 30 de setembro de 2012

Batalha contra o espelho

Roberta de Medeiros

As cirurgias plásticas viraram uma obsessão do cantor americano Michael Jackson, cujas intervenções começaram em 1984 e não pararam mais. Em uma entrevista concedida em 1993 à apresentadora americana Oprah Winfrey, o astro pop se descreveu como perfeccionista e "nunca satisfeito com nada", incluindo a sua aparência. Jackson não estava sozinho. Afinal, quem nunca se sentiu insatisfeito diante do espelho ao menos por um dia? Mas há quem confira dimensões extremas à conhecida fábula do patinho feio e transforme o próprio corpo num verdadeiro campo de batalha. São pessoas que sofrem de uma desordem psicológica chamada dismorfofobia ou transtorno dismórfico, que as faz alimentarem ideias irreais sobre a própria imagem corporal. É o caso da engenheira química C., de 39 anos, que teve sérios problemas devido à excessiva preocupação com a sua aparência física. Dizia que seu rosto se tornava flácido e que suas bochechas estavam prestes a desabar. Começou, então, a se sentir insegura a ponto de não sair na rua sozinha. Deixou de dirigir, ficando a maior parte do tempo em casa. Passou a ter espasmos no rosto e deixou até mesmo de falar. Exames clínicos, porém, não mostraram qualquer alteração na pele ou no tônus muscular do rosto de C., mulher jovem e de boa aparência.

O distúrbio foi relatado pela primeira vez pelo psiquiatra italiano Enrico Morselli, em 1886. À época, foi descrito como um sentimento de feiura ou defeito no qual a pessoa sente que é observada por outras, embora a sua aparência esteja dentro dos limites da normalidade. Por isso, o distúrbio recebeu o nome de "hipocondria da beleza". Somente nos Estados Unidos, o distúrbio atingiria cerca de 5 milhões de pessoas ou 2% da população. "Trata-se de uma certeza, muitas vezes delirante, de que uma parte do corpo não está bem. Enquanto a pessoa que alucina inventa o mundo, o delirante vê o mundo com outros olhos", compara o neurologista Edson Amâncio, autor do livro O homem que fazia chover.

"Em geral, as queixas envolvem falhas imaginárias ou leves no rosto ou na cabeça, como acnes, cicatrizes, rugas ou inchaços", diz. Dificuldades sociais e conjugais ocorrem com as pessoas que têm o transtorno, dependendo da gravidade, a ponto de terem sua vida completamente desestruturada. "O prejuízo pode ser resultado do tempo que se gasta com a atenção ao corpo, em detrimento de outros aspectos da vida, quase sempre negligenciados", diz Amâncio. "Quem sofre da doença se olha com frequência no espelho ou em outras superfícies refletoras para checar a aparência, o que pode consumir muitas horas por dia numa atitude compulsiva bastante difícil de resistir", diz o neurologista. Outros, ao contrário, esquivam-se de espelhos em uma tentativa não bem-sucedida de diminuir o mal-estar e a preocupação.

Camuflagem

As queixas de quem tem preocupação exagerada com o corpo, entretanto, são vagas. Muitas pessoas evitam descrever seus defeitos em detalhes, podendo se referir à sua "feiura" em geral. Essas pessoas tentam camuflar seus defeitos imaginários com óculos escuros, bonés, luvas ou roupas. O psiquiatra e psicoterapeuta Geraldo Possendoro, professor da Unifesp, lembra que a crença de que algo está errado com o corpo pode extrapolar todos os limites. "A pessoa pode se queixar de que os poros do nariz estão muito abertos, por exemplo. Muitas vezes não há defeito algum ou o defeito é supervalorizado pelo paciente", diz Possendoro, para quem o problema muitas vezes está associado à baixa autoestima.

Os indivíduos com esse transtorno frequentemente pensam que os outros estão observando o seu "defeito", o que pode levar a uma esquiva das situações sociais que, levada ao extremo, chega até ao isolamento social. "Esses pacientes buscam e recebem tratamentos para a correção de seus defeitos imaginários, em uma peregrinação por diversos profissionais, principalmente cirurgiões plásticos, sem, no entanto, corrigir os supostos defeitos", diz Possendoro.

Dificuldades sociais e conjugais ocorrem com as pessoas que têm o transtorno, dependendo da gravidade

Alguns especialistas chegam a questionar se a anorexia poderia ser um caso de dismorfofobia, já que os indivíduos supervalorizam o tamanho do seu corpo e se angustiam com seu defeito imaginado. Já Possendoro defende o diagnóstico diferencial entre anorexia do transtorno dismórfico.

O tratamento inclui antidepressivos e psicoterapia. A literatura, no entanto, aponta a possibilidade de que o transtorno seja, na verdade, um delírio somático, uma crença irreal (e incorrigível pela argumentação) sobre o próprio corpo. "Nesse caso, o tratamento incluiria a administração de antipsicóticos associados a antidepressivos", diz Possendoro.
"Quanto à história familiar, não existem dados que estabeleçam um padrão claro do transtorno dismórfico corporal com outros transtornos psiquiátricos", diz Amâncio.

Dismorfofobia e outros transtornos obsessivos
Pacientes com transtornos obsessivos têm maior atividade em uma determinada região do cérebro, o córtex pré-frontal, o que os leva a ter procedimentos de controle exagerados, como retornar à própria casa várias vezes para checar se o fogão ou o ferro de passar foram desligados. Ou seja, estão sempre em estado de alerta. Dos transtornos psiquiátricos, o que mais se assemelha em critérios diagnósticos com a fobia social é o transtorno dismórfico corporal. Em ambos, os pacientes apresentam ansiedade social elevada, esquiva de situações sociais e medo de crítica e comentários adversos sobre sua aparência. Isolamento social e falta de habilidade social geralmente estão presentes nos dois casos.

Herodotus
Transtorno dismórfico corporal é um novo nome para um velho transtorno. Ele tem sido descrito nas literaturas europeia e japonesa por uma variedade de nomes. A primeira referência aparece na história de Herodotus, no mito da garota feia de Esparta, que era levada por sua enfermeira, todos os dias, ao templo, para se livrar da sua falta de beleza e atrativos.

Neurose compulsiva
Emil Kraepelin (1856-1926), grande psiquiatra alemão, considerado o criador da moderna Psiquiatria devido às suas enormes contribuições científicas contidas ao longo das oito edições de seu Tratado de Psiquiatria, ocupou-se do tema dismorfofobia, introduzindo-o na oitava edição do Tratado sob a rubrica de Neurose Compulsiva. Considerou a dismorfofobia como uma das formas clínicas da série de medos obsessivos que surgem do contato com outras pessoas. É desta forma que a dismorfofobia assemelha-se à timidez, ao medo de provas e à antropofobia, entre outros.

Homem dos lobos
Entre os casos clínicos publicados por Freud, o do paciente Serguéi Constantinovitch Pankejeff ficou conhecido como o "Homem dos lobos". Ele iniciou sua análise com Freud em 1910 e apresentava, entre outros sintomas, uma preocupação excessiva com a aparência de seu nariz. Antes de iniciar a análise com Freud, já havia feito vários tratamentos e se consultado também com os médicos Theodor Ziehen, de Berlim, e Emil Kraepelin, de Munique. Esse histórico, com certeza, aumentou o interesse de Freud pelo caso, pois considerava esses dois importantes médicos como "rivais" de profissão.

Tipos de delírio 
Alguns autores defendem que a dismorfofobia pode se apresentar como um tipo de delírio que se caracteriza pela presença de uma imagem distorcida em relação ao corpo. Conheça os tipos de delírio:

Delírio erotomaníaco 
A pessoa acredita ser amada por uma pessoa que ocupa posição superior, como autoridades e artistas.

Delírio de grandeza 
A pessoa está convencida de que tem ligação com personalidades importantes ou que tem um talento especial ou possui grande fortuna. 

Delírio de ciúme 
Sem motivo justo, a pessoa acredita que está sendo traída. Ela toma medidas extremas, às vezes tiranas, na tentativa de controlar o parceiro. 

Delírio persecutório
É o tipo mais comum entre os paranoicos ou delirantes crônicos. O delírio costuma envolver a crença de estar sendo vítima de conspiração, traição, espionagem, perseguição.

Delírio somático
São formas de delírio em relação ao corpo. Os mais comuns dizem respeito à convicção de que a pessoa tem deformações de certas partes do corpo.

Narcisismo

Para a psiquiatra Magda Vaissman, professora da UFRJ, transtornos de personalidade como narcisista, obsessivo- compulsivo e borderline podem predispor à dismorfofobia. "É muito frequente que o transtorno esteja associado ao narcisismo. Do ponto de vista psicanalítico, é um problema na elaboração do narcisismo primário. No complexo de Édipo, a criança sai do narcisismo para ir ao encontro do outro. Mas isso pode não ser bem elaborado, dando origem à personalidade narcisista", explica.

Em outros casos, a dismorfofobia está relacionada ao transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), no qual a pessoa se entrega a uma série de rituais de verifi cação do corpo, marcas e cicatrizes para afastar um pensamento incômodo ou intrusivo. A diferença do paciente com TOC em relação àquele que sofre de dismorfofobia é que, no primeiro caso, ele está convencido de que o pensamento intrusivo que leva à compulsão não é verdadeiro, embora não consiga se libertar, enquanto no segundo caso, a preocupação com o corpo é quase um delírio. "O quadro pode se apresentar como uma compulsão, no qual a pessoa segue uma série de rituais ou pode ocorrer ao nível do pensamento, que são as obsessões", analisa.

Ela lembra que a vigorexia, uma espécie de dependência por exercícios físicos associada ao culto à imagem, pode ser uma variante da dismorfofobia. "A pessoa nunca está satisfeita com o corpo, acha que pode perder massa muscular, mergulha numa rotina extenuante de exercícios e, muitas vezes, recorre aos anabolizantes para manter o tônus muscular", diz Magda.

Critérios Diagnósticos do Transtorno Dismórfico Corporal

A. Preocupação com um imaginado defeito na aparência. Se uma ligeira anomalia física está presente, a preocupação do indivíduo é acentuadamente excessiva. 
B. A preocupação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. 
C. A preocupação não é mais bem explicada por outro transtorno mental (por exemplo, a insatisfação com a forma e o tamanho do corpo na anorexia). 

Referência: Edson Amâncio, O homem que fazia chover Editora Barcarola

Cultura do belo

Uma entrevista feita com 162 homens e 184 mulheres pela divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas, em São Paulo, mostrou que 69% dos entrevistados passaram pelo menos uma hora por dia pensando que não têm uma boa imagem. Mas o que leva cada vez mais pessoas a um descontentamento tão grande com a própria aparência?

Alguns especialistas chegam a questionar se a anorexia poderia ser um caso de dismorfofobia

O transtorno pode ser reflexo de uma sociedade obsessivamente preocupada pela estética corporal, que vende corpos nos meios de comunicação. "A nossa sociedade finge que o transtorno não é um problema. Há um individualismo exacerbado, as pessoas vivem isoladas, as famílias são desestruturadas... A cultura do belo incentiva a competição, o indivíduo vive mergulhado numa sensação de fracasso, ele sente que nunca vai chegar lá", afirma Magda.

"O problema é que a maioria das pessoas com dismorfofobia não procura atendimento psiquiátrico, já que a sociedade incentiva a cultura do belo", analisa Magda. Outro motivo que afasta dismórficos dos consultórios é que muitos preferem se entregar ao bisturi. Pesquisa feita pelo Instituto InterScience revelou que 90% das mulheres e 65% dos homens afirmam sonhar com mudanças no próprio corpo. Do total, 5% já tinham feito alguma plástica e 90% já faziam planos de realizar a segunda. Entre aqueles que nunca fizeram uma cirurgia plástica, 30% declararam que esperavam ter coragem para realizá-la.

Um estudo feito pelo Observatoire Cidil des Habitudes Alimentaires (Ocha) em um universo de mil mulheres revelou que 86% delas se dizem insatisfeitas com suas medidas. Apenas 14% alegaram estar satisfeitas com o próprio corpo. O Brasil é o segundo no ranking dos países que mais realizam cirurgias plásticas, metade delas puramente estéticas - 40% lipoaspiração, 30% mamas, 20% face. A maioria foi realizada em pessoas de 20 a 34 anos. O número de jovens que colocaram próteses para "turbinar" os seios aumentou 300% nos últimos dez anos.

E não adianta o familiar contrariar o paciente que sofre do transtorno. "Quanto mais oposição se faz, mais se cria uma resistência por parte do paciente. O ideal é não incentiválo. O que a família pode fazer é mostrar que há outros prazeres na vida, que não o culto ao corpo, e fazê-lo entender que ele sofre de uma doença", aconselha Magda.

Essas pessoas podem apresentar fortes ideações suicidas. 13% dos pacientes psiquiátricos britânicos apresentam o transtorno. 75% das pessoas com dismorfofobia não se casam ou se divorciam, 70% têm ideações suicidas e 25% realmente se suicidam. 20,7% das pessoas que fazem cirurgias de rinoplastia têm um possível diagnóstico de dismorfofobia. Pesquisa feita pela Universidade de Utrech, na Holanda, mostra que as mulheres que se submetem a operações de implante mamário apresentam risco três vezes maior de cometer suicídio em relação às demais mulheres. 82,6% das pessoas que sofrem o transtorno se sentem insatisfeitas com os resultados das cirurgias. Existe a crença de que a próxima intervenção será a última. E assim, entram num circuito no qual a insatisfação é cada vez maior. Muitos casos vão parar na Justiça.

O problema nos faz questionar sobre a ética no exercício do cirurgião plástico. "O médico deveria estar preparado para identificar a dismorfofobia. O ideal seria uma interação entre o cirurgião e o psiquiatra ou o psicoterapeuta. Muitas vezes o profissional faz a correção daquilo que é um grande incômodo para o paciente, e esse desconforto em relação à aparência se desloca para outra região do corpo", observa Amâncio.

Outros transtornos somatoformes
O transtorno de somatização (historicamente chamado de histeria ou síndrome de Briquet) é um transtorno polissintomático que se inicia antes dos 30 anos, estendese por um período de tempo e é caracterizado por uma combinação de dor, sintomas gastrintestinais, sexuais e pseudoneurológicos.

O transtorno somatoforme indiferenciado que se caracteriza por queixas físicas inexplicáveis, com duração mínima de seis meses, abaixo do limiar para um diagnóstico de transtorno de somatização.

O transtorno conversivo envolve sintomas ou déficits inexplicáveis que afetam a função motora ou sensorial voluntária, sugerindo uma condição neurológica ou outra condição médica geral. Presume-se uma associação de fatores psicológicos com os sintomas e déficits.

O transtorno doloroso caracteriza-se por dor como foco predominante de atenção clínica. Além disso, presumese que fatores psicológicos têm um importante papel em seu início, gravidade, exacerbação ou manutenção. A hipocondria é a preocupação com o medo ou a ideia de ter uma doença grave, com base em uma interpretação errônea de sintomas ou funções corporais.

O transtorno dismórfico corporal é a preocupação com um defeito imaginado ou exagerado na aparência física. O transtorno de somatização sem outra especificação é incluído para a codificação de transtornos com sintomas somatoformes que não satisfazem os critérios para qualquer um dos transtornos somatoformes.

Fonte: Psiqweb /G J Ballone

Disponível em <http://portalcienciaevida.uol.com.br/esps/Edicoes/67/artigo225215-1.asp>. Acesso em 29 set 2012

sábado, 15 de setembro de 2012

Neuroimagens comprovam relação entre culpa e sintomas da depressão

Mente e Cérebro
09 de agosto de 2012

Em Luto e melancolia (1917), o psicanalista Sigmund Freud apontou como um dos traços mentais da “melancolia” – como se referia aos transtornos depressivos – a presença de sentimentos exagerados de culpa. Agora, cinco neurocientistas, entre eles o brasileiro Jorge Moll, registraram imagens do cérebro de pessoas com histórico de depressão e descobriram que a “troca de informações” entre regiões envolvidas na autorrecriminação e na percepção de comportamentos socialmente aceitos é deficiente.

Os pesquisadores usaram ressonância magnética funcional (fMRI) para examinar o cérebro de pessoas que se recuperaram dos sintomas da depressão havia mais de um ano e de outras que nunca tiveram o transtorno enquanto elas relatavam como se sentiram em situações como trair a confiança de um amigo ou se recusar a ajudá-lo. Os resultados, publicados na Archives of General Psychiatry, mostram pela primeira vez a interação entre o lobo temporal, associado ao julgamento de comportamentos, e a região subgenual, área do córtex pré-frontal relacionada ao processamento de emoções e a circuitos neurais responsáveis pela regulação de neurotransmissores como serotonina e dopamina. Segundo os neurocientistas, a conexão entre essas partes é menor em pessoas com histórico de depressão.

Curiosamente, a interação entre essas áreas revelou-se menor apenas quando os voluntários foram induzidos a se culpar – ao desaprovarem a conduta de outras pessoas, não foram detectadas alterações significativas. Estudos complementares já foram iniciados na Inglaterra para avaliar se  dissociação entre regiões neurais pode representar risco de desenvolver depressão ou de retorno dos sintomas depois do tratamento.

Disponível em <http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/neuroimagens_comprovam_relacao_entre_culpa_e_sintomas_da_depressao.html>. Acesso em 07 set 2012.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Más condições de vida favorecem transtornos mentais, alerta pesquisa

Agência Brasil
19/03/2012

A violência urbana e a falta de qualidade de vida favorecem o desenvolvimento de transtornos mentais na população, segundo a coordenadora do Núcleo Epidemiológico da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), Laura Helena Andrade.

Para a pesquisadora, esses fatores são responsáveis pela prevalência de problemas como a ansiedade, depressão e uso de drogas em cerca de 30% dos paulistanos.

O dado faz parte de uma pesquisa feita em consórcio com a OMS (Organização Mundial da Saúde) e a Universidade de Harvard, publicada em fevereiro.

REGIÕES POBRES

O estudo conseguiu identificar grupos mais vulneráveis a esses transtornos, como os migrantes que moram nas regiões pobres da cidade. "A gente vê que os homens migrantes que vão para essas regiões têm mais risco de desenvolver quadros ansiosos, do que os que migram para as regiões com melhor condição", ressaltou.

"As mulheres que vivem nessas regiões mais remotas, que são chefes de família, têm mais risco de quadros ansiosos e quadros de controle de impulso", completou.

As condições de vida dessa população fazem com que o Brasil tenha um número maior de afetados, cerca de 10%, do que outros países que participaram do estudo, além de uma ocorrência maior de casos moderados e graves.

"Em segundo lugar vem os Estados Unidos, com menos de 7%, e em outros países é menos de 5%", disse a pesquisadora.

Para Andrade, as doenças são indicativos dos problemas sociais enfrentados pela população da periferia da capital paulista.

"Essas pessoas que estão vindo para São Paulo, estão vindo para regiões mais violentas, estão mais expostas à violência. Então, acho que [elas] precisariam realmente ter políticas habitacionais. Tem que melhorar a qualidade de vida das pessoas. Melhorar a escolaridade, o ambiente onde elas vivem", declarou.

Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/1063868-mas-condicoes-de-vida-favorecem-transtornos-mentais-alerta-pesquisa.shtml>. Acesso em 16 jun 2012.

terça-feira, 6 de março de 2012

Ansiedade é transtorno mais comum na Grande São Paulo

Mariana Versolato
25/02/2012 - 18h05

Uma pesquisa que mapeou a frequência de doenças mentais na Grande São Paulo mostra que os transtornos de ansiedade, como estresse pós-traumático, fobias e síndrome de pânico, lideram e estão presentes em 20% da população.

Depois vêm os transtornos de humor, como depressão (11%), de controle de impulsos (4,3%) e por consumo de drogas (3,6%).

Os dados são do projeto São Paulo Megacity, um estudo realizado pelo IPq (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas de São Paulo com 5.037 residentes dos 39 municípios da região.
A amostra é representativa das cidades, e as entrevistas foram feitas pessoalmente entre 2005 e 2007.

Dados preliminares já haviam sido apresentados em 2009, mas agora a pesquisa completa, que faz parte de um grande estudo mundial, foi publicada na revista científica "PLoS ONE".
Segundo a psiquiatra Laura Helena Andrade, coordenadora do estudo, a pesquisa procura entender o contexto relacionado a essa prevalência maior.

A violência urbana ajuda a explicar a forte presença dos transtornos mentais na população --54% dos entrevistados relataram ter vivido uma experiência ligada a crimes, como ser vítima ou testemunha de assaltos e sequestros.

Pessoas que vivem em áreas mais pobres e periféricas da cidade também tiveram maior risco de desenvolver os transtornos.

"Cada fator inerente à vida na metrópole, como transporte, violência e acesso a serviços de saúde, tem uma parcela de participação nesse resultado", afirma Paulo Rossi Menezes, professor associado da USP e epidemiologista psiquiátrico que não participou do estudo.

Gravidade

A pesquisa mostrou que 10% da população em São Paulo tem doenças psiquiátricas graves. Esse índice está acima da média de outros 14 países, segundo a Organização Mundial da Saúde. Nos EUA, a prevalência é de 5,7%.

Só um terço dos brasileiros com transtornos graves recebeu tratamento nos 12 meses anteriores às entrevistas.

"Os transtornos mentais são frequentes, mas pouco reconhecidos e tratados. A sociedade sabe pouco a respeito e há um estigma ligado às doenças", diz Menezes.

Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/1053547-ansiedade-e-transtorno-mais-comum-na-grande-sao-paulo.shtml>. Acesso em 29 fev 2012.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Cérebro de homens e mulheres reagem de forma distinta ao medo

BBC BRASIL
Atualizado em  25 de agosto, 2011 - 05:40 (Brasília) 08:40 GMT


O experimento mediu a atividade neurológica de homens e mulheres nos instantes que antecedem seu contato com imagens negativas, positivas e neutras. Ambos os sexos recebiam indicação prévia, por meio de um cartão, sobre qual tipo de imagem iriam ver. Em todos os casos, a atividade cerebral se comportou de maneira estável, sem mudanças, a não ser no caso das mulheres na iminência de ter uma experiência considerada negativa.

Giulia Galli, que liderou a pesquisa no Insituto de Neurociência Cognitiva da UCL, sugere que a diferença na atividade cerebral tem relação com diferenças na memória dos dois gêneros. "Quando estão à espera de uma experiência negativa, as mulheres têm maior capacidade de resposta emocional que os homens, pelo que indica sua atividade cerebral. É provável que isso afeta o modo como elas se lembram do evento negativo", diz.

A pesquisadora explica que a formação da memória se dá de diferentes maneiras. "Ao assistir cenas perturbadoras em filmes, muitas vezes há pistas de que algo 'ruim' irá acontecer, como a música emotiva. A pesquisa mostra que a atividade cerebral nas mulheres entre a pista e a cena perturbadora influencia o modo como a cena vai ser lembrada. O que importa para a memória dos homens em vez disso é, principalmente, a atividade cerebral durante a cena em si", explica. Para a cientista, a descoberta pode ser útil no estudo de transtornos psiquiátricos, como ansiedade, em que há expectativa excessiva.

Memória

A pesquisa foi feita com 15 mulheres e 15 homens. O sinal usado para prenunciar que tipo de cena seria rapidamente vista foi um rosto sorridente, no caso de uma imagem positiva (paisagens bucólicas), um rosto neutro para uma imagem não-emotiva (um objeto qualquer), e um rosto triste para uma imagem negativa (cenas de violência extrema).

Cerca de 20 minutos após medição da atividade cerebral, o estudo apresentou as mesmas imagens ao grupo de homens e mulheres, como num jogo de memória. O estudo mostrou que as imagens consideradas negativas tiveram algo grau de memorização entre as mulheres, mas não entre os homens. Ambos reagiram de maneira similar, no entanto, em relação à memória de imagens neutras e positivas.

Disponível em <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/08/110824_memoria_investigacao_mm.shtml>. Acesso em 01 out 2011.